Aviso geral: os próximos recortes são da inteira
responsabilidade do escritor. Não deverão ser assim tomados como certos.
Tratam-se de apreciações e julgamentos de carácter pessoal. Mas transmissível.
Família, de sangue ou não: sei da minha ausência e do tempo
que vos tenho mantido em suspense. Ou na falta de dimensão em sentimento tal tenho-vos
mantido, se nada mais, desinformados.
Muito se passou nos últimos dois meses de explorações
Antárticas mas pouco que se possa mostrar. É um sentimento inglório mas
glorificante. E vivência é intensa e transbordante, como qualquer outro contrato
no âmbito do meu ofício. Mas esta rota, tem a especial qualidade de nos manter
cheios, mas com pouco que possa servir de mostra, ou prova.
Ajuda talvez se desmistificar alguns aspetos e perguntas
frequentes:
1º - Não está assim
tão frio por esta altura. Raras foram as ocasiões em que a temperatura desceu
abaixo dos 0ºC durante o dia, o que é bastante suportável. Existe no entanto o chamado “Chilling Factor” a ter em conta
talvez mais aqui do que em qualquer outro lugar. Esse factor tenta equacionar a
diferença entre a temperatura real, e a que nós sentimos, com base em fatores
que assim o agravem como o vento e/a humidade. É um cuidado acrescido mas que nesta temporada
não foi razão de danos maiores. Um pouco mais de gelo aqui, uns quantos
passageiros mais doentes, mas nada de irreparável.
2º - Não vi absolutamente nenhum Urso branco e felpudo.
Esses vivem no Pólo Norte... não no sul.
3º - Os pinguins por aqui são às centenas de milhar. E muito
facilmente identificáveis tanto na água pela forma saltitante com que nadam,
como em terra. Não se dão ao trabalho de esconder colónias. Na verdade têm
muito poucos predadores naturais e como tal limitam-se a escolher o melhor
local. Que de resto é identificável a milhas de distância pelo cheiro. A
urina... ou a palavra correta será “guano”.
4º - Avistamentos de Baleias de Dorso (espero ser esta a
tradução certa de humpback whales) são acontecimentos bastante comuns. Diários para ser preciso. Por mais de uma vez,
devido à curiosidade natural destes mamíferos, e a falta de predadores
conhecidos, fomos seguidos por grupos superiores a 20. O mesmo se passou com
golfinhos, que desconhecia serem fans de águas tão frias. Frias sim... mas tão
frias não.
5º - Existe também o mito do flash verde. Consiste num
clarão de tom esverdeado que é suposto ser possível avistar na primeira fracção
de segundos ao nascer do sol, ou no último, no ocaso do mesmo. De todas as vezes que tentei, em nenhuma
ocasião se confirmou. Mesmo nas tentativas mais a sul, em que o sol nasce às
02:30 da manhã. Não ouvi também relatos de sucesso nas conversas várias sobre o
assunto. Assim, e como na minha primeira linha relembro, mantenho a minha (e só
minha) opinião de que é um mito não confirmado.
Por mais fotografias que tenha para vos mostrar, por mais
vídeos de pinguins saltitantes, nenhum deles faz justiça ao sentimento que nos
atravessa. O deserto gelado, o infindável e imparcial branco, o isolamento
total. Esses sim, constituem a minha ideia do sétimo continente. E nenhum deles
é suportado em formato digital.
Abreijos